Durante um tempo da minha infância, meus avós maternos ainda moraram em Taiaçú, uma pequena cidade do interior de São Paulo, onde nascemos. Naquela cidade, eles construíram a base de sua história juntos: casaram-se, tiveram quatro filhas e as criaram. Lá também fizeram muitos amigos, em relações que os seguiram por toda a vida.
Quando suas filhas já moravam em São Paulo, casadas e com filhos, decidiram que também era tempo de se juntar a elas. E lá se foram eles.
A casa de meus avós era encantadora e recebia seus visitantes com um jardim cuidadosamente cultivado pelas mãos prestimosas de Vovó Marianina. Nesse jardim vi crescer lindas margaridas, experimentei azedinhas, assisti o lento caminhar dos caramujos. Assim como no quintal lá de casa, naquele jardim também sonhei meus sonhos e imaginei o futuro.
Moravam ali Vovó Marianina, Vovô Sinhô, Tia Chiquinha e Tia Magda, na casa da frente. No mesmo quintal, Tia Maria, Tio Antonio e meu primo Antonio Carlos (ou Caio, como prefere a maioria). E cabiam todos os outros em dias de domingo. E cabiam ainda muitos mais em dias de festas.
Meus avós recebiam os netos nas férias e juntos tratávamos rapidamente de quebrar a ordem da casa. Nesses dias os espaços eram ocupados por nossa imaginação, incentivada pela cumplicidade de Tio Antonio e com a contribuição sempre sutil de Vovô Sinhô.
Havia sempre algum cantinho para explorar, uma novidade, um armário, uma gaveta, um baú. E existiam baús mesmo, personagens das histórias contadas por Tia Chiquinha sobre a viagem de minha bisavó da Itália para o Brasil, repletos de guardados que despertavam nossa curiosidade.
Somos oito primos, sendo três um pouco mais velhos: Caio, Claudia, Glória, Lú, Dimas, Junior, eu e Lúcia, nessa ordem. Sempre gostamos demais uns dos outros e fomos muito felizes nessa infância em comum. Nossos reencontros hoje são uma deliciosa continuidade daqueles tempos.
Um dia, a vizinhança ganhou uma família nova, que instalou-se na casa ao lado e invadiu nossa família sem cerimônias. O casal trazia, além da sogra, três filhas: Odila, Regina e Eliane.
Regina sempre foi a mais reservada. Odila identificou-se com minha irmã Glória e viraram amigas. E Eliane decidiu que era mesmo parente.
Eliane era ainda muito pequena, mal aprendera a andar e desfilava sua graça pela casa ganhando a atenção de meus avós, numa disputa injusta conosco considerando a distância que morávamos. Além deles, Eliane se enlaçou no coração de minha Tia Maria, a quem conquistou para sempre e passou a chamar de “Bá”.
À parte nosso ciúme de criança, o fato é que Eliane instalou-se no coração de cada um de nós, nossas famílias tornaram-se de verdade uma só e acabamos por gostar muito disso. Somos parte de um mesmo grupo que se gosta, que sente saudade, que ri junto e se conforta nos momentos difíceis.
A casa de meus avós ainda existe, bem diferente do que foi na minha infância. Ali ainda mora Tia Maria, junto com todas as memórias de nossa família, seladas para sempre naquelas paredes e em nossas lembranças.