Viajei, trouxe comigo um galho de uma planta que dá um buquê
de flores brancas lindas. Veio embrulhado com carinho para não machucar na viagem.
Lá onde o galho foi colhido, dizem que essa flor branca é como praga, que basta
deixar na água pra criar raiz, depois plantar. Olho meu galhinho todos os dias
e sonho com a flor.
Nesse lugar onde estive os buquês brancos de flor espalham-se
pela cidade, enfeitam as entradas das casas, as ruas, a igreja.
Parece tolice dizer que gosto de flores, mas é preciso sim.
Tem gente que vive uma vida inteira sem notar a presença delas. Costumo dizer
que tem uma espécie de gente que vive a vida sem poesia. São pessoas que moram
em casas sem cores, pessoas práticas, duras. Comem sem sentir o gosto, não abraçam,
não choram nos filmes.
Aprendi muitas coisas boas com a minha família, entre elas,
a observar detalhes e me perder na beleza das flores. Cresci rodeada delas.
A vida toda vi meu pai chegar da rua com flores para minha
mãe. Flores de todo o tipo, qualquer uma que estivesse à mão para declarar sua
paixão por ela. E ela recebia o mimo com um sorriso tímido, sem muitos
agradecimentos, mas ficava feliz, claro. Era o jeito deles, um código só dos dois.
Até gestos lindos como esses viram rotina e paramos de
observar que continuam acontecendo dia após dia. E chega uma hora que a vida nos joga lá pra frente na estrada e ficamos lembrando, lamentando tantos detalhes perdidos.
A rotina esconde pequenos momentos que carregam toda a ternura do mundo.
Sempre tivemos flores em casa. Quando não estavam lá pairava uma secura no ar, e logo alguém tratava de consertar o desequilíbrio.
Minha avó Marianina gostava de margaridas e elas forravam seu jardim. Eram sua marca no mundo. Cláudia, minha irmã, herdou dela o jeito com as plantas e ainda hoje passa horas mudando os vasos de um lado para outro, ajeitando tudo em busca do melhor ângulo.
Minha avó Marianina gostava de margaridas e elas forravam seu jardim. Eram sua marca no mundo. Cláudia, minha irmã, herdou dela o jeito com as plantas e ainda hoje passa horas mudando os vasos de um lado para outro, ajeitando tudo em busca do melhor ângulo.
Das flores da minha vida, lembro em especial das que ganhei na minha adolescência. Foram muitas. Havíamos descoberto como era bom enviar flores uns para os outros e nos meus aniversários a sala de casa exibia flores de todo tipo, enviadas por meus amigos, o namorado e pretendentes também, claro.
Naqueles dias, quando alguma angústia ficava insuportável, eu saia para caminhar sozinha. E andava muito e muito,
chegava do outro lado do bairro e voltava invariavelmente carregada de flores
para casa. Fiz isso muitas vezes e era como se deixasse pelas ruas todas as
mágoas e fizesse das flores um recomeço. E me esquecia de tudo ajeitando o
vaso, flor a flor, procurando também como minha irmã o lado mais bonito do
arranjo para que fosse visto.
Durante toda a minha vida as flores estiveram por perto. As flores
do jardim de minha avó, as flores na sala de casa, nas festas que organizei, nas mesas dos jantares que ofereci. Nos momentos alegres e para espantar a tristeza, sempre estiveram presentes.
Flores, gosto de todas e de algumas em especial: as rosas brancas de meu pai, as margaridas de
minha avó, os lisianthus que descobri sozinha e aprendi a amar.
As lembranças das minhas flores trazem as cores, os cheiros, as imagens de toda
uma vida.
Estão nascendo algumas folhinhas no galho que trouxe da
viagem. Será que verei os buques de flores brancas?
Tomara que sim! Vou lá conferir.