quinta-feira, 23 de junho de 2011

Um gato preto cruzou nossa história

Minha infância foi vivida em meio a muitos bichos. Os nossos e todos os da vizinhança.

Naqueles quintais que nos rodeavam havia gatos, cachorros, peixes, papagaios e vários outros pássaros. Havia também um macaco e houve até uma onça, vinda sabe-se lá de onde, que ficou por um tempo presa por uma coleira no quintal de uma das casas despertando nossa curiosidade e medo.

Um dia a rotina dos quintais foi quebrada pelo aparecimento de um gatinho ainda filhote. Era mirrado, sem pelos e tinha um machucado muito feio nas costas. Todos se apiedaram do bichano, que exibia sinais claros de ter sido maltratado. 

Logo o gatinho estava cercado de protetores e de carinho. Apesar disso, o caso exigia cuidados especiais e ninguém estava seguro dessa competência. 

Pois foi minha mãe que teve coragem de assumir os cuidados do filhote e levou seu protegido para nossa casa. Pensando agora naqueles tempos, vejo que minha mãe gostava mesmo de animais, embora dissesse que aquela bicharada só servia para aumentar o trabalho da casa, que já era muito.

O tempo passou e o gatinho mirrado, muito bem cuidado em seu novo lar, ganhou peso e recuperou a pelagem. Aos poucos foi emergindo daquele projeto de felino o gato mais bonito e charmoso da região. Lindo, preto, angorá, tinha as quatro patinhas brancas, como se fossem botinhas. Olhando para ele, via-se os bigodes brancos naquela carinha negra e uma manchinha branca como uma barbicha, que descia pelo pescoço e crescia branqueando toda a barriga.

Ganhou o nome de Moustache.

Além de lindo e charmoso, Moustache era dono de uma personalidade encantadora. Pacífico, bonachão, deixava-se virar do avesso e apenas ronronava carinhosamente. Era também um tanto desastrado, gostava de dormir em cima da televisão, aquecendo seu sono no calor que saia do aparelho, e muitas vezes caia de lá, escorregando e arranhando a tela da TV na tentativa de se salvar.

Todos gostavam dele. Até Zackie, nossa gatinha feroz.

O que não era doce em Moustache era o miado. Era um som grave, desafinado e muito alto. Nunca mais ouvi um miado tão desajeitado como o dele. 

Moustache ficou conosco por dois anos. Um dia, não voltou de seu passeio e nunca soubemos por quê. Esperamos ouvir aquele miado por muito tempo, mas ele não voltou.

Saiu de nossas vidas como entrou: sem aviso, sem explicações. Deixou na casa um grande silêncio e muita saudade.

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