O sonho de minha mãe era que eu fosse uma menina comportada, vestidinho engomado, dessas que brincam com suas bonequinhas impecáveis e depois recolhem todos os brinquedos, sem deixar vestígios do que fizeram.
Isso não tinha lá muita graça.
Eu brincava de bonecas, fazia comidinhas, tinha uma casinha com móveis feitos pelo vizinho marceneiro, é verdade. Mas também queria soltar pipa, correr descalça pelas ruas, jogar bola, andar de carrinho de rolimã e de bicicleta. E passei minha infância assim.
Estava quase sempre sem sapatos, o que deixava minha mãe desesperada. Ao fim do dia, voltava para casa com o cabelo desalinhado, as roupas sujas de terra, feliz da vida.
Apesar dessa “falta de modos”, falava baixo e obedecia as regras da casa sem muita discussão. Sempre fui pacífica e achava muito mais fácil viver assim.
Meu pai colaborava com nossas brincadeiras transformando folhas de jornal em barquinhos, chapéus, capuchetas e nós ficávamos no quintal inventando histórias. Quando se organizava melhor, fazia pipas muito coloridas. Eram sempre em forma hexagonal e com um longo rabo de elos de papel de seda formando correntes. Eram únicas. Não eram as mais delicadas, é certo, mas subiam e mesmo de longe mostravam olhos marotos e um sorriso aberto. Impossível saber como levantavam vôo com tantos detalhes, mas iam alto e ficavam lindas no céu.
Ele também nos ensinou a jogar pião. Nos mostrou como enrolar o cordão e soltá-lo no chão. E nosso pião saia girando, girando pelo quintal. E quanto mais jogávamos, mais acrobacias possíveis iam se descortinando para nós. E nosso pião girava, subia em nossas mãos e voltava para o chão, quicava e girava, girava, em movimentos precisos e harmoniosos.
Ele gostava de brincar, mas também com isso nos mantinha sob controle. Tinha muito medo de nos ver longe de casa, sujeitos a todos os perigos das ruas. Sempre foi muito assustado com tudo, e disso todos nós temos um pouco dele.
Encantava-se com crianças, acho que porque sua alma era um pouco assim. E inventava brincadeiras, contava histórias, nos ensinava cantigas. A vida inteira as mesmas histórias, as mesmas piadas, e a gente ria disso e ele ria também, como uma criança grande.
Meu pai fazia dobraduras de papel e com elas pássaros que batiam as asas. Pássaros de todos os tamanhos, coloridos e felizes.
maravilhosa!!!!!!!! mas o "Quintal" ainda é a minha preferida..... bjs
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